Ele deveria ter notado. Se não fosse pelo
seu sexto sentido, o cheiro nauseabundo serviria de alerta de que algo
estava errado. Mas ele foi em frente, dominado pela bebida que entorpecia
todos os seus sentidos.
O fato de sentir uma coisa viscosa, ao ligar o interruptor
da luz, não o impressionou. Ele deveria ter desconfiado daquele
fedor forte que agrediu seu nariz, mas ele estava anestesiado pelo álcool,
e não se deu conta. Como se estivesse em outro lugar, ele ouviu
aquele murmúrio chamando pelo seu nome, mas ele não se deu
conta. De repente, a luz se apaga, e ele sente que algo esta presente naquela
sala, o que era ele não saberia dizer. Algo começa a brilhar
na escuridão, como se
fossem duas brasas. Ele estende a mão em direção
àquela luz, e recua horrorizado, o que havia tocado era viscoso
e mal cheiroso! Ele acende seu isqueiro e grita de terror! À sua
frente estava um espectro, algo que já havia sido humano e agora
era uma sórdida imagem de um corpo em adiantado estado de putrefação.
Ele não consegue se mover, está paralisado pelo álcool
e pelo terror. O espectro movimenta o que restou de sua boca, mas apenas
golfadas de pús dali saem. A lastimável figura lhe aponta
o quarto de dormir, é como se quisesse que ele para lá se
dirigisse. Aos tropeços, o bêbado para lá se dirige.
Ao abrir a porta, um cheiro insuportável toma conta de tudo! Ali,
na cama, estava um corpo apodrecido, um cadáver de alguém
que havia morrido a muito tempo atrás. Ao observar melhor, ele começa
a distinguir outros vultos ao redor do leito e, para sua surpresa, os identifica
como amigos que ele já não via a certo tempo. Eram velhos
companheiros de bebedeira, que haviam desaparecido ao longo do tempo. Ao
seu lado, o espectro lhe indicava que ele deveria se aproximar daquela
cama,
e ele assim o fez. Dava para se notar a intensa movimentação
dos vermes sobre aquele corpo, disputando os pedaços de carne apodrecida
que ainda restavam sobre o esqueleto. Foi aí que ele se deu conta!
Tudo ficou mais claro, e a bebedeira passou. Ele reconheceu as roupas que
embrulhavam aquele corpo mal cheiroso, e o dente de ouro naquela boca
escancarada, que mais parecia um sorriso dos infernos acabou com suas dúvidas.
Era dele o corpo que ali apodrecia, resultado de um tiro nas têmporas.
Ele havia se suicidado!